Wednesday, September 24, 2025

Imergir em Atmosferas Vocálicas: Um Método de Inscrição


 Decidi que não escreveria nenhuma palavra minha, que seguiria uma linha imaginária no meio da multidão e que imergiria ou mergulharia nas suas múltiplas atmosferas vocálicas.

Daria 70 passos, repousaria durante 7 minutos e inscreveria 7 frases breves, simples e claras: Sujeito + verbo + complemento. Daria novamente 70 passos não-lineares, repousaria novamente durante 7 minutos e inscreveria novamente 7 frases breves, simples e claras: seria sempre somente a inscrição de frases ouvidas nas vozes vivas próximas. 

Cada paragem de inscrição permitiria uma imersão ou mergulho em atmosferas vocálicas singulares, onde abundariam certamente os sentidos do heterogéneo, do singular, do efémero, do fragmentário, do incompleto, do avulso - instantes aleatórios no meio de estórias vivendo-se sem princípio nem fim. Na minha inscrição discreta, guardada no meu caderno disfarçado em camuflagem de livro para não perturbar a espontaneidade expressiva, ficaria tudo cozido em páginas densas, como se fosse uma única voz a confiar-me a sua verdade múltipla, sem querer, sem saber, sem poder fazer de outro modo.

Este seria o meu romance-diário auditivo da multidão dispersa na praia. Teria rapidamente tanta matéria-prima que precisaria de construir uma máquina transformadora para que, uma a uma, cada personagem e seus monólogos, integrada num complexo de personagens e seus diálogos, pudesse nascer daquela Desordem tão potencialmente íntima e bela, cheia de segredos e de estórias-dentro-de-estórias.  

 Assim, poderia talvez reencontrar a minha paz com a verdade das estórias, a verdade da Literatura e a verdade da humanidade em Literatura: escrever somente palavras verdadeiramente estranhas e próximas, permanecer fiel às vibrações dos meus sentidos abertos às vidas vivendo-se sobre mim, inscrevendo-se em mim, neste tempo de infinitos tempos realmente transportadores de tudo.  

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