Sunday, February 26, 2012

aroma de O.


ela foi ver o mar ao equador e aprendeu a geografia do sol e seus clamores e seus delírios. era o mês do trigo e da fúria ou apenas uma ideia de amadurecer e de pôr a boca na fonte.
ela luta corpo a corpo contra o espaço, contra o tempo, contra a energia da angústia. entrou no círculo dos seios desnudos. chegou tão nua. quebrou o cristal dos antigos impossíveis. escreveu um verbo: lutar em pleno voo, apesar das asas feridas. disse ou cantou: vou seguir os animais até ao equinócio da Primavera. tantas alegrias inacabadas. tantas paredes entre o Inverno e a Primavera. tantas plantações imaginárias. tantos ventos contrários.
no centro do corpo havia uma ferida com líquidos e combustões que ligavam o coração ao Azul, ao arco Azul e às falésias onde as aves marítimas se fundem com o Amanhecer. tudo o que ama pode fundir-se ao Amanhecer através das feridas.
ela encontrou a dura raiz do obscuro que vinha desde a infância. uma promessa nunca cumprida. o corpo procurava e perdia-se. havia o Azul único, o da absoluta intensidade na ideia de Futuro.
sonhou um equinócio. pediu tempo. tantas coisas. tantas coisas. tudo pesava demais para voar até à hora do fruto. aprendeu a nudez. voar nua, retirando energias do Azul, o único Azul, a contra-corrente de todos os rios. o Azul que vinha do tremor dos animais interiores. a Origem flutuante, o nome da madrugada que acaricia os seios. tão dolorosos. na sua sombra inconsolável. desejei morrer infinitamente. o fim de todo o Real. desejei o absurdo. todos os meus músculos eram contradições de Eros beijando Nada.
ou amor ou morte. todas as mulheres trágicas respiraram as rochas da Ausência, sem princípio e muito incêndio. lancei todas as sementes para Agora. a nudez dos seios. a vibração do princípio que vem e não vem. vem e não vem. acabou o pão, acabou a água. estou perdida. joguei tudo.

não faltará pão por caminhos longos e estreitos. o universo decidiu acreditar na Primavera. estamos salvos. se o Texto escreve a Noite inteira onde se desnuda infinitamente o Possível.
o medo vem desentender o amor. pode ser uma ferida maior do que as asas. cada madrugada tem o fim da Primavera. e a saliva transforma-se em cinza. se o silêncio inunda o desejo até esquecer que faz frio. tanto frio. a ideia de perder-se começa a sangrar pelos olhos. tanto medo de abandono. tanto aroma de nenhuma luz. mas tu acendes no sangue os sonhos. os frutos. tu acreditas na Primavera, estás salva.
agora sabes quase tudo da vida, sobretudo o olhar que desenha o equinócio. tanta luz, quanta treva. no mesmo corpo. que explode e não explode. entre muitos alfabetos de pele. no processo infinito da nudez. salvas o universo ao amanhecer. trazes a boa febre da Origem.

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