Friday, December 24, 2010

absoluto indefinido


estou a ver-me a ir ao mar. nitidamente. no coração do inverno.
estou sozinho. as minhas rochas interiores bramem como tigres, uivam como certos silêncios.

as aves soltam espuma de dentro do sol. estou sozinho. no vértice da espera. uma fenda de alto abaixo. no segredo. Dirás sim e não. muitas vezes. sem contradição. acontecerão lagos e ondas na tua arquitectura quase voadora.

Receio as linhas rectas. as suas detonações contra as portas em mim. gota a gota. soma-se a minha sede à tua sede. pergunto-me sozinho. se chegarás. a tarde toca na impossibilidade de beber o sol. o futuro é um incêndio longínquo que me arde nas extremidades. a vida dança-me e bate-me nos olhos. estarei sozinho. se vier a tua chegada. nascerei quando desejares que o meu corpo respire. castelos no ar. hesitaremos entre o mar e a floresta em busca do êxtase. nasceremos em chamas.
estou sozinho.

Não. Sim. incertamente virás. os lobos das fábulas crescem entre sim e não. talvez. sofrem muito. desarmados de carícias entre as árvores.

queria desenvolver-me em paisagem onde a espera fosse o ritmo dos animais apaixonados. a loucura traz um anjo que entra na substância das coisas. nossa música. haverá. se me esquecer de quem sou. a memória da música no corpo incandescente até ao fim ou origem.

pedes-me a língua. dou-te a fonte inteira. sem angústia. esperarei.
chegou o mar. chegará a tua boca.
hesito se a nudez será a Hora.

para lá das forças (construtivas e destrutivas) da esperança.

Wednesday, December 22, 2010

aproximação


no esforço da aproximação, o corpo sente a distância com íntima exactidão.
todos os músculos estremecem diante da expansão do Vazio. as mãos compreendem a alteração do espaço numa vertigem de passagens e do tempo numa aceleração inclinada para a superfície dos sentidos completos...

a verdade passional é (e não é) uma hipótese de Oceano entre os lábios... melancolia com chocolate pode (e não pode) salvar uma Vida

Herself as Path and Abyss


this explosion was herself without compromise. true. she had something new, forcing less and less, blowing the doors wide open... yet she was not fully aware of all butterflies, questions of belief and unbelief, very hot and red... she had no fixed definition for pain nor vertigo nor womb quakes... though she had it all. too much.

silence was easier to drink than rain. but desert grounded the deployment of oscillations. striving for the contrary sun. the inner beginning of heat waves against the rocks of nothing.

could the dynamic of the only language come to the surface? burning slowly and acutely

Tuesday, December 7, 2010

a gramática sagitária dos rios


Os Amantes aproximam-se dos rios para estudarem as gramáticas das suas vidas fluidas... estudam as torrentes de inverno, os meandros das margens, as fontes dos afluentes, a arquitectura das pontes, as ânsias dos remadores, os estuários das aves, as artes do transbordo, as rotas dos cardumes, as emoções da foz... ficam, assim, mais íntimos do seu Mistério Indomável das contra-correntes...

Dos Amantes da Intensidade e da Plenitude escrevem-se epopeias com grandes navegações de corpo inteiro... A sua Escrita convoca todas as armas em chamas e a nudez divina da Alegria...

Os arcos estão tensos, as setas apontadas, os músculos prontos: o chão levanta-se vertical diante de deuses ofegantes, aflitos. A espiga, a concha, a floresta, a pedra... entram no combate contra os monstros inimigos de Eros e de Kosmos...

Um oráculo disse Desejo. Outro Nada. A polpa do fruto arde lentamente como a espada elástica da Noite. A ordem do ritmo aprofunda o abismo e o espelho dos segredos.
O movimento inclina as colunas da terra e do céu face à luz do Nu. Desabam todos os impérios de abandono com o silêncio das águas... Vem o sol - meia-noite meio-dia - pelas curvas proféticas das melodias inacabadas... É manhã ou será. A textura da pele cobre a hora de claridade.

...

os dois pés na instabilidade do instante
as duas mãos na verdade da respiração
os dois olhos no ângulo da ausência

simetria quebrada em rostos de mulher com fumo recôndito e peito exposto
a túnica esconde a queda das harpas e dos frutos, esconde o corpo de jovem palmeira

desde as origens até aos confins a fúria da nudez continua de ilha em ilha à flor do inteiro

Friday, December 3, 2010

corpo sobre pedra


A verdade é simples, mas complica-nos. Também a possibilidade do amor.
A verdade é inteira, mas fragmenta-nos. Também a possibilidade da morte.

Também a água é tão fácil de fluir e banhar, mas a sede mata. E a inundação afoga, mesmo na imaginária página desnuda de um corpo sobre o vento ou a melodia de outro corpo.

Se o que digo coincide obscuramente com o que calo, nunca saberei tocar o fogo sem o ardor lavrar a minha areia azul, com linhas de peito e de chão, para longe, para além de todas as sementes ou sílabas ou remoinhos latentes.

A raiz roda em torno do segredo: treme a noite e seus lentos lábios. Haverá sempre uma ferida que cintila e explode como um cavalo maduro, desdobrando suas luas torrenciais.

Uma carícia pode salvar do abismo. Uma carícia pode oferecer a concha onde murmura o mar. As asas do mar nascente, nos confins do desejo de voar, seriam frágeis línguas de fogo, abrindo as pétalas do silêncio, com sua saliva de beijo, onde germina um certo Apocalipse.

Os pássaros do desejo conhecem a frescura infinita da angústia. Aí cantam, como anjos que nascem e explodem com ternura e suor. Mistério da paixão: todos os músculos ardem. Também as pedras - as montanhas inteiras - vêm do magma e voltam ao magma. Não há vida nua, nem Princípio nem Respiração, fora do fogo. Quanto mais denso, mais verdadeiro.