Wednesday, August 14, 2024

Viver na floresta e subir às árvores


 As florestas vivem dentro dos rios

a minha Alegria nasce dentro da floresta

a cidade viva cresce dentro da Alegria

Quando era criança subia às árvores: abraçava o tronco, chamava os ramos, olhava o céu como uma escada de corda... imaginava-me voadora, corpo-sopro-vento... 
subia às árvores com o impulso 
do meu desejo de saber a textura das matérias vivas, saboreando entre as mãos e a boca...
Quando era adolescente subia às árvores com o impulso 
do meu desejo de construir um espaço de Poesia, uma concha secreta de paz, um prazer silencioso entre o Ideal do sentimento sagrado de poder-ser-feliz e o esforço do corpo inteiro compreendendo o real que resiste, a incapacidade de subir mais alto do que certos ramos difíceis, impossíveis para o meu corpo... aprendi a verdade e o espanto de cair e recair e estudar melhor o dilema de não ter asas nem garras nem outros poderes, senão o desejo de subir, apesar do corpo tão sensível à fricção e ao choque... aprendi a sentir (mais por dentro) o contacto e a subida: o texto do meu corpo respirando (mais por dentro) sobre o texto das árvores

Construía cabanas nas árvores para ver o mundo de um outro ângulo (mais por dentro - como o ignorante Desejo-de-bem-e-de-belo)... Fazia uma escada no tronco do texto das árvores para chegar às minhas cabanas, subia e escondia-me através da Diagonal Infinita do segredo... porque secreta é sempre a Diagonal que sobe (mais por dentro), a Diagonal de desejar mais do que ser-e-não-ser...

Não havia segredos em mim, não sabia segredos de ninguém... Mas as cabanas nas árvores são cofres infantis e adolescentes para guardar segredos que podem ser a ponte de vento por onde os pássaros atingem a Alegria futura...
As cabanas das árvores precisam de segredos para florescer na infância e adolescência. Eu inventava segredos sem linguagem. Inventava tudo: a matéria do segredo e o código do segredo e o lugar da sua ocultação... inventava Tudo com todos os sentidos abertos: esta invenção é a infância que renasce dentro da adolescência, tão perplexa, tão transbordante de músculos novos...

Guardava secretamente os segredos inventados 
redigidos com luz branca em papel branco, tudo iluminado 
com os raios penetrantes do meu sol oculto: uma sombra de Diário Adolescente perguntando Quem sou,
pura sensação de enigma à flor da pele...

Quando era jovem, quasi-adulta, subia às árvores com o impulso do meu desejo de amar... 
Está aberto o tronco por onde subir, abertos os ramos onde abrigar, 
aberta a floresta inteira dentro dos meus rios: 
Tudo significa a expectação:
Podes subir e permanecer    

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